Dez em dez especialistas em fundos imobiliários destacam o atual momento como extremamente atrativo para aquisição de cotas de FIIs dos mais diversos segmentos. A argumentação é que há grandes descontos em praticamente todas as classes.
Para ficar nisso, eu não precisaria redigir este texto – um story no Instagram seria suficiente. Para ir adiante, como você merece e como gosto de fazer, resolvi dar materialidade ao tema.
Sim, dados! Odiados por tantos, ignorados por muitos (afinal, não tem o engajamento de uma bela frase de efeito), a meu ver, eles são essenciais para a compreensão de qualquer fato – repito, qualquer fato. Do contrário, seria apenas uma retórica vazia ou, no popular, o famoso “papo de botequim”.
Entendendo na prática
Para dar essa materialidade, eis que assumi os seguintes cenários e premissas:
- Simulei uma carteira formada por quatro FIIs, cada um de um segmento distinto, a saber: logístico, escritórios, shopping centers e recebíveis imobiliários (CRI ou simplesmente papel);
- Os FIIs foram escolhidos por terem histórico mínimo de seis anos e gestoras diferentes, para que ninguém avente a possibilidade de que o objetivo seja propagandear gestora A ou B e, por fim, FIIs com grande liquidez no mercado secundário;
- Os FIIs escolhidos teriam participação idêntica na composição do portfólio hipotético;
- As escolhas foram feitas com alto grau de aleatoriedade, sem nenhum respaldo em teoria de portfólios, tampouco, profunda análise dos ativos que estão nos FIIs, estrutura de capital, etc.
- NÃO SE TRATA DE RECOMENDAÇÃO DE COMPRA OU VENDA. O objetivo é meramente educativo, inclusive por conta do alto grau de aleatoriedade na seleção dos FIIs.
A missão é avaliar qual seria o potencial de geração de renda passiva com o patrimônio de R$300 mil investidos nessa carteira, tanto em 2019, ano de forte alta do Ifix (+36%), quanto agora em 2025.
Rendimento em 2019
Naquele ano, as manchetes de jornais eram extremamente positivas para os FIIs. Basta lembrarmos que tivemos o recorde de captação nos fundos imobiliários, com R$35,5 bilhões, sendo que mais de 60% desse volume foi para FIIs de tijolos.
A carteira hipotética com iguais participações (25%) tem a seguinte composição:
FII | Gestão | Setor | PL Atual (bilhões) |
XPML11 | XP Asset | Shopping Center | R$ 6,7 |
JSRE11 | Safra | Escritórios | R$ 2,1 |
HGLG11 | Patria | Logística | R$ 5,5 |
KNIP11 | Kinea | Papel | R$ 7,4 |
Fonte: Economatica
Em 2019, quando o Ifix encerrou o ano aos 3.197 pontos e o DY médio da carteira teórica do índice tinha prêmio de 390 pontos-base em relação ao Tesouro IPCA+ 2035 (DY do Ifix de 7,15% versus 3,91% para a taxa do Tesouro IPCA+ 2035), assumindo como premissa uma carteira hipotética com os percentuais já descritos e com preço de cada FII sendo o preço médio lá em 2019, temos a seguinte geração de renda passiva, igualmente hipotética.
1- Preço médio (média aritmética pela cotação de média diária) em 2019.
2- Considera que o dividendo efetivo anual foi distribuído de forma linearizada, ou seja, todos os meses de forma igual.
3- P/VP média de fechamento dos meses em 2019.
Fontes: Economatica e relatórios gerenciais dos FIIs
A carteira hipotética (veja, uma CARTEIRA) teria gerado em 2019 um total de R$18.985 em dividendos, o que equivaleria a uma renda mensal de R$1.582. Tal montante perfaz um DY mensal de 0,53% e anual de 6,52%, isento de Imposto de Renda para pessoas físicas.
Note que o nível do rendimento inclusive ficou abaixo do DY gerado pelo Ifix, mais uma evidência de que escolhas aleatórias, ainda que privilegiem a diversificação setorial, nem sempre gerarão resultados satisfatórios, ainda que o DY não deva ser a única métrica para aferir se um portfólio é ou não um portfólio vencedor.
Mas, voltando aos dados da tabela, guarde bem tais informações, elas serão importantíssimas adiante. Veja o nível de renda passiva mensal gerado por tal carteira em 2019 e garanto que investidores se digladiavam pelas cotas dos FIIs que geravam esse patamar de rendimento. Basta lembrarmos as inúmeras emissões que ocorreram naquele ano, em que a figura do rateio era comum justamente porque a demanda por cotas era superior à oferta.
Inclusive, o ímpeto comprador se refletiu na forte valorização do mercado que podemos observar no nível de ágio (P/VP) exibido pelos FIIs ao final de 2019, incluindo a própria carteira hipotética, que teria um ágio de 9% na média do ano e ágio de 14% considerando a cotação de final de 2019.
Rendimento em 2025
Agora desembarcamos em 2025 e, no cenário dos FIIs, longe da euforia de 2019: ainda que o Ifix esteja renovando máximas históricas nos pregões de final de junho e começo de julho, acumulando alta de 12% no ano.
Fato é que, se o Ifix tivesse subido o suficiente para acompanhar a inflação desde o final de 2019, deveria estar hoje próximo aos 4.435 pontos. No entanto, o atual patamar é de 3.492 pontos, no momento em que redijo este texto. Assim, podemos inferir que, do ponto de vista real, o Ifix está 27% abaixo de onde deveria estar no cenário que propus.
Com o CDI próximo a 15,0% a.a. e o Tesouro IPCA+ com taxas de pelo menos 7,00% a.a. para os vencimentos em 2030 até 2050, temos um momento desafiador para ativos de risco e maior remuneração da renda fixa. Isso afastou o ímpeto dos investidores para aquisição de cotas de FIIs, ainda que tenhamos observado a base de investidores pessoas físicas sair de 645 mil ao final de 2019 para superar os 3 milhões de CPFs segundo as atuais estimativas (alô, B3, que tal voltar a divulgar o boletim mensal de FIIs para termos tais números atualizados?).
Mas o que estaria acontecendo com o investidor ou a investidora que pegasse agora os mesmos R$300 mil do exemplo de 2019, sem nenhum tipo de correção monetária, e montasse a mesma carteira hipotética, os mesmos quatro FIIs, cada qual com participação idêntica? Vamos aos números:
1- Cota 2025 (cotação de fechamento em 30/06/2025).
2- Considera que o dividendo efetivo anual (últimos 12 meses em 30/06/2025) foi distribuído de forma linearizada, ou seja, todos os meses de forma igual.
3- P/VP em 30/06/2025.
Fontes: Economatica e relatórios gerenciais dos FIIs
Para calcular a capacidade de geração de renda dos FIIs da carteira hipotética para os 12 meses adiante, foram utilizados os últimos 12 meses, considerando eventuais guidance oferecidos pelos gestores em seus relatórios gerenciais, para ponderarmos a razoabilidade de que o atual patamar de distribuição é verossímil para o período posterior e minimizar efeitos não recorrentes de renda.
Por óbvio, situações como vacância ainda não conhecida ou inadimplência não integram o rol de premissas, assim como correção de receita imobiliária por inflação. Entendo que tais parâmetros são, de certo modo, conservadores com base nas informações que são públicas.
Com a materialização desse cenário, seria gerada uma renda anual de R$29.744, equivalente a um dividendo mensal de R$2.479, ou seja, 56,7% acima daquele gerado pela mesma carteira, com base no mesmo capital inicial, em 2019. Importante destacar que, nesse período, a inflação acumulada pelo IPCA foi de 39%. O nível de DY a ser gerado equivale a 10,4% a.a., ou seja, um prêmio de 340 pontos-base em relação à taxa do Tesouro IPCA+ 2040.
Se em 2019, a carteira hipotética encerrou o ano com ágio de 14% e demonstrando um menor potencial para ganho de capital futuro, o exercício feito com os preços atuais mostra a mesma carteira hipotética com deságio de 13%. Ou seja, é possível obter maior nível de renda mensal, maior prêmio em relação ao título público federal e, ainda assim, carregar uma posição que notoriamente tem espaço para ganho de capital oriundo de valorização das cotas.
Resumindo
Volto ao ponto que me motivou a realizar o exercício. Veja como o mesmo capital de mais de três anos atrás é capaz de gerar um nível muito maior de renda recorrente nos preços atuais dos fundos imobiliários (em termos reais). A renda mensal da carteira hipotética que, no exercício com dados de 2019, era de R$1.767, passou para R$2.622 com base nos preços de cotas atuais.
É essa reflexão que trago a você. Nesse tipo de cenário, devemos colocar energia e capital para construção de uma carteira de FIIs. E veja, a seleção de ativos para a carteira foi aleatória, então, imagine que uma seleção mais estruturada, com base em análises qualitativas e quantitativas, prezando por uma diversificação maior, seria capaz de gerar um cenário ainda melhor. É este tipo de seleção que oferecemos aqui na Finclass.
Lembre-se: barganha em preço de protetor solar não costuma aparecer em dia ensolarado.
Um grande abraço,
Ricardo Figueiredo